terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Opinião de quem sabe

Freeport
“Sócrates não está acima da lei. Mas também não está abaixo dela para ser julgado e assassinado na praça pública”
Tenho seguido o caso Freeport com uma sensação que é um misto de vómito e de náusea. Não sei se é uma campanha negra. Mas que é uma campanha histérica que, mais uma vez, põe os jornalistas cheios de calores nervosos, onde jornalistas comentam o que escrevem outros jornalistas, onde muitas notícias contradizem muitas outras, onde no quadro da mentalidade servil e obediente, herdada do tempo de todas as submissões, o que vem de Inglaterra é bom, aquilo que aqui se faz, não presta, onde os ódios, especulações, vaidades pessoais, com muita ignorância à mistura, vêm ao de cima, disso não tenho dúvidas. Misturam-se política e eventuais crimes de corrupção, e intermináveis debates, mais apostados na discussão banal do que na análise séria, estão a provocar danos terríveis neste pobre país massacrado por tantos danos, por tantas crises, por tanta ignorância diplomada.
Lendo o que se lê em vários formatos, ouvindo o que se diz, percebo melhor a procuradora Cândida Almeida, possivelmente a única voz serena e firme que se escutou, mas que foi rapidamente dissolvida no burburinho da tempestade. A investigação criminal não se compadece com o ‘diz-se’, com a especulação sobre coincidências de aprovação deste ou daquele projecto, com a excitação em torno das declarações de um tio. São meros vestígios. Aquilo que importa, numa perspectiva criminal, é saber se determinado fulano político recebeu dinheiro, ou outros favores, para realizar um determinado fim. Se recebeu, quem é que lho pagou. Como pagou. Onde pagou. Se recebeu, onde é que se encontra o dinheiro. Quem deu. Quem viu dar. Onde deu. Quando deu. Quanto deu. Como deu. O que importa é demonstrar, por documentos e/ou testemunhos, que fulano recebeu. Estabelecer aquilo que é a essência do processo-crime: o nexo de causalidade entre crime e criminoso.
Até agora, aquilo que sabemos positivamente é que um tal Smith terá sacado milhões aos seus compatriotas, dizendo que era para pagar a A, a B e a C. Diz ele. Ou terá dito. Não sei. Só revela que o Smith sacou, ou pretendeu sacar, grossas maquias. Quanto à segunda fase da operação, estamos a zeros. Nem uma pista. Nem uma prova. Nem uma coincidência entre decretos-lei e eleições são prova seja do que for. Fica-nos o Carnaval dos debates, da politiquice na rasteirice mais vergonhosa, enquanto se afunda a imagem de Sócrates no meio deste vómito. Não está acima da lei. E deve ser investigado. Mas também não está abaixo dela para, como na repetição de tantos outros casos, ser julgado e assassinado na praça pública.
Francisco Moita Flores, Professor universitário

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